2/13/2012

PARA O RESGATE DA MEMÓRIA DA CIDADE


NO MUNDO DA EDUCAÇÃO E DA CULTURA

ESCOLA NORMAL MUNICIPAL DE FLORIANO

PARTE II

Memórias do Professor Djalma Silva, transcrita de uma edição do Jornal de Floriano

Colaboração: Nelson Oliveira

A Escola Normal funcionava no prédio conhecido como “ a casa do senhor Marinho “. Um casarão com muitas salas e um imenso quintal de meia quadra cheio de árvores frutíferas: umbuzeiros, goiabeiras etc.

O meu diretor era o doutor Manoel Sobral Neto; o vice diretor a professora Hercília de Barros Camarço, que em várias oportunidades assumiu a direção. Secretário era o senhor Benedito Azevedo; vigilantes ou inspetores de alunos, além de dona Carmosina no curso de Adaptação, Maria de Lourdes Coelho,
Ana Magalhães Gomes e Heli Paiva; fiscal de governo, Antonio Veras de Holanda.

O doutor Manoel Sobral Neto dirigia a Escola com mão firme. Muito enérgico, apesar de jovem, controlava as expansões de pouco mais de uma centena de moças e rapazes, considerados indisciplinados, por um regimento sobre muitos aspectos rígidos.

No corpo docente uma plêiade de professores de escola sem formação específica e sem qualquer preparo pedagógico a maioria, mas todos dominando disciplinas que lecionavam e era, além disso, de alto poder de comunicação e senso de responsabilidade.

Recordo aqui alguns que foram meus professores. Doutor Manoel Sobral Neto, formado em Direito, lecionava inglês e francês. Em suas aulas, como era costume, adotava a leitura e a tradução ou versão do texto e noções de gramáticas. Exercitava também a conversação envolvendo toda a classe. Como não perdia a oportunidade de uma reprimenda nos alunos que erravam, ninguém se arriscava a comparecer as aulas sem a lição sabida.

José Raimundo de Vasconcelos, o professor Zezinho, sem curso superior. Ensinava matemática. Explicava o ponto com muita desenvoltura numa linguagem impecável; explicava novamente se alguém demonstrava não ter apreendido. Passava exercícios e problemas que nunca repetia nas provas e exames. Homem de espírito expansivo mesmo, de ampla cultura, respondia qualquer pergunta que lhe fosse feita nos campos mais diversos do conhecimento. O que levava alguns alunos comentarem com malícia: “ o professor Zezinho quando não sabe, inventa!”

Dalva Nascimento. Normalista. Humanizava a física para os seus alunos.

João Rodrigues Vieira, mais conhecido por doutor Joça, era professor de Geografia. Farmacêutico. Foi também prefeito de Floriano. Seu método era por demais simplista, mas funcionava. Abria o compêndio de Veiga Cabral e lia, fazendo pequenos comentários. Na aula seguinte mandava cada aluno dissertar o ponto. Como a classe era pequena, isso era possível num espaço de 150 minutos. Grande figura humana o doutor Joca. Espírita praticante e atuante. Quando a aula terminava ele ficava conversando conosco por alguns momentos contando casos. Fazendo brincadeiras.

Albino Bento Leão da Fonseca ( o Binú ). Lecionava História com muito entusiasmo. Aulas interessantes, factuosas e agradavelmente expostas. Constantemente nos passave dissertações. Com grande admiração pelas mulheres, perdia-se às vezes nas exaltações às personagens históricas femininas de sua preferência. Em certa época lecionou português, motivando-nos com a literatura com freqüentes exercícios de redação.

Doutor Mário Dias Pereira. Agrônomo. Também professor de História. Grande professor, cujas aulas eloqüentes deixaram muito boas recordações.

Dona Ricardina ( não me recordo o sobrenome ) era, se não me engano, normalista. Outra professora de História, que lecionou em curto espaço de tempo, deixando agradáveis recordações, tanto pelas aulas bem expostas e simplística.

Dona Hercília Barros Camarço. Normalista. Grande professora de desenho e música. Mulher prendada. Pintava muito bem e tocava piano. Uma verdadeira artista e grande educadora a quem várias gerações de florianenses muito lhes devem.

Bartolomeu Barbosa Matos, o Bató, como era mais conhecido. Lecionava educação física . Um dos professores mais queridos da escola. Aberto, brincalhão, amigo, mas professor enérgico. Preenchia os seus 50 minutos de aula de modo intensivo; ordem unida, ginástica e jogos. Às vezes saía com os alunos pelas ruas da cidade em exercício de marcha e de resistência. Na véspera das festas cívicas, quando a escola tomava parte nos desfiles, Bato dedicava todos os seus esforços no preparo  dos alunos e consequentemente numa boa apresentação do estabelecimento. Bato mais tarde foi vítima de uma inominável injustiça e demitido de sua cadeira.

Etelvina Gonçalves Nunes e Judite Santana. Duas grandes professoras de trabalhos manuais. Não poupavam os homens de alguns trabalhos com agulhas como fazer remendos e pregar botões.

Doutor Sebastião Martins de Araújo Costa, médico humanitário. Outra grande figura humana. Foi professor de biologia.

João Francisco Dantas. Músico e compositor. Foi por algum tempo professor de música.

Doutor Fernando de Oliveira Marques. Foi farmacêutico, foi prefeito de Floriano. Lecionava francês. E, apesar da idade, já avançada e da saúde precária, era pontual às aulas. Certa vez, em meio a uma das suas crises cardíacas, chegou à sala ofegante, cansado e nos disse: “ meu maior desejo é um dia tombar entre vocês.” Suas aulas seguiam métodos tradicionais: leituras. Tradução ou versão de textos, noções de gramática, conversação e frequentemente nos levava livros e jornais franceses para motivarmo-nos ou testar nossos conhecimentos. Um dia, doutor Fernando levou para a aula uma vida de Santa Teresinha. Abriu o volume sobre a mesa e chamou os alunos um a um para ler e traduzir trechos que ele indicava. Ao chegar minha vez, aproximei-me da mesa e, como os outros alunos, me coloquei ao lado dele. Doutor Fernando virou algumas folhas do livro e parou onde havia um pedacinho do manta da Santa. “ Leia! “ Exitei. Havia duas páginas. Qual delas deveria ler? “ Leia!”, insistiu o mestre. Procurei sair do impasse; nervoso, levei a mão à página onde estava o pedacinho do sagrado manto, tocando-o. Aqui? Doutor Fernando bateu com o punho na mesa e explodiu: “ Seu bandido em relíquia não se pega”. Era assim o doutor Fernando Marques, mas amigo, compassivo, sentimental. Notável figura humana que marcou, com suas aulas, e seu modo de ser, aqueles que gozaram da sua ventura de tê-lo tido como mestre.









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